Existem diversas visões sobre o território, variando muito de pessoa para pessoa. Consoante a formação de quem avalia determinado elemento, a sua opinião será sempre de acordo com os seus ensinamentos e convicções. Assim, a visão de um geólogo e de um geomorfólogo, são diferentes. Cada um tem um ponto de vista distinto sobre o mesmo elemento em causa, o que por vezes leva à separação de conhecimentos e à divergência de conceitos. É fundamental haver a conciliação de conhecimentos, quando está em causa a conservação dos valores geológicos e geomorfológicos, como refere CASTALDINI (2009).
Por Património entende-se todos os lugares com valor universal excepcional para a humanidade. Assim, o Geopatrimónio definido por RODRIGUES (2008), “…como o conjunto de valores que representam a Geodiversidade do território”, engloba o património geomorfológico, geológico, hidrológico, pedológico, entre outros. Segundo este autor, este conceito surge do termo equivalente em inglês “Geoheritage”, englobando as Paisagens e os Geossítios e quando conjugado com o Património Cultural (material e imaterial), proporciona o desenvolvimento de uma actividade, designada por Geoturismo. “O Geopatrimónio será, por sua vez, constituído por todo o conjunto de elementos naturais abióticos existentes à superfície da Terra (emersos ou submersos) que devem ser preservados devido ao seu valor patrimonial “ (RODRIGUES, 2008).O património geomorfológico corresponde às formas de relevo e depósitos correlativos dos mesmos e aos processos que testemunham a evolução herdada e actual das paisagens. As formas de relevo com atributos particulares são classificadas como geomorfossítio e fazem parte do património cultural de um determinado território CORATZA (2005). Um geomorfossítio com determinados atributos tem valor cultural, científico, socioeconómico e cénico.
A identificação dos elementos naturais e geomorfológicos com determinada singularidade e especificidade de uma paisagem numa determinada região, deve inserirse num conjunto global onde se dê primazia à sua valorização, divulgação e, acima de tudo, à sua preservação.
Como refere PANIZZA (2009), na “Geomorphodiversity”, há uma grande complexidade e dificuldade na definição e entendimento de conceitos que envolvam a geodiversidade “extrínseca e intrínseca”. O primeiro termo é descrito por este autor, como as diferenças geológicas de um sítio quando comparado com outro, enquanto o segundo é entendido pela complexidade geológica de um determinado local. BRILHA (2005), também reconhece a elevada subjectividade existente em torno do valor intrínseco, pelo simples facto de ser difícil quantificá-lo. Quando se fala de Geodiversidade, muitas são as controvérsias em torno deste conceito, definido por SHARPES (1995) em COUTO (2005), como a integração de diferentes sistemas geológicos (substrato rochoso, solos, paisagem, entre outros), interligados com os processos geológicos. Para STANLEY (2001), este conceito é mais abrangente ao considerar a interligação do homem com o meio físico e a cultura, havendo interacção entre eles através da paisagem, solos, biodiversidade, entre outros. Porém, a definição mais abrangente de PANIZZA (2007) em RODRIGUES (2008), parece a ser a mais adequada ao englobar uma variedade de ambientes geológicos e geomofológicos, considerados como a base para a diversidade biológica da Terra. PIACENTE (2005) menciona a crescente atenção que se vem dando a este conceito, tanto na literatura internacional, como na elaboração de legislação.
Quando se faz um estudo de Geodiversidade de um determinado conjunto de elementos numa determinada área, tem de se ter em conta a diversidade, a frequência e a distribuição dos mesmos e, pelo estabelecimento de índices e indicadores, permite a comparação com áreas diferentes. À variedade ou abundância destes elementos numa área, como por exemplo uma região, dá-se o nome de geodiversidade intrínseca.
Compreende-se assim, que a Diversidade Natural da Terra engloba a Biodiversidade e a Geodiversidade. CASTRO (2010) defende vários critérios na valorização de Geopatrimónio, dividindo este em várias categorias. A primeira correspondente ao valor intrínseco considerando os mesmos elementos referidos anteriormente, a idade, a associação aos elementos culturais, grau de conhecimento, associação com outros elementos do meio natural e o estado de conservação. Na segunda menciona as potencialidades de uso, tais como a possibilidade da realização de actividades, condições de observação, acessibilidade e a quantidade de população no seu redor. Por último, refere a necessidade de conservação, mencionando as ameaças e potencialidades, a regulamentação (legislação), as fragilidades, entre outros. CENDRERO (1996) também refere estes aspectos de valorização de Geopatrimónio nas suas monografias.
No Geopatrimónio devem tomar-se medidas ou adoptar-se práticas políticas que defendam a conservação dos elementos classificados, pois o Homem só conserva algo, quando o objecto em causa tem algum valor. Este valor pode ser intrínseco, estético, cultural, científico ou educativo. RODRIGUES (2008), refere que para a conservação de valores geológicos e geomorfológicos, traduzidos por Geoconservação, é necessário educar e esclarecer a população do valor que estes sítios encerram e, além destes, “…desenvolver planos ou estratégias de ordenamento que contribuam não só para a sua conservação mas também para a sua promoção”. Porém, há uma estreita relação entre o conhecimento científico e a Geoconservação, permitindo a abertura de novas fronteiras a qualquer um de nós ao interagirmos com o geomonumento e, através desta, nasce um novo conceito de cultura e lazer (COUTO, 2005). Tanto no inventário, como na monitorização destes geossitios e geomorfossitios, é necessário haver uma descrição das suas características para um planeamento correcto de actividades. Assim, é necessário a sua inventariação e a integração destes dados nos sistemas de informação geográfica (bases de dados) e, através das potencialidades que esta ferramenta proporciona, divulgá-los através dos novos meios de comunicação como a internet (webgis). No entanto, GRAY (2002) menciona que quanto mais divulgado um elemento, mais procura terá, logo a pressão exercida sobre estas áreas será mais elevada, o que requer medidas adicionais, na manutenção e equilíbrio, não pondo em causa o elemento classificado e, só assim, haverá sustentabilidade. CARCAVILLA (2009) sublinha a importância da preservação destes locais e a necessidade de medidas mais eficazes ao nível da legislação.
Os dividendos resultantes do turismo representam uma elevada percentagem de certas economias regionais, sendo em algumas delas, o único meio de desenvolvimento. Neste contexto, o levantamento/classificação de Geopatrimónio numa dada área é essencial, tanto para a sua preservação, como na divulgação de novos elementos classificados, possibilitando o desenvolvimento de actividades ligadas ao turismo, entre outras. Tudo funciona em conjunto, ou seja, a valorização de áreas com algumas potencialidades até aqui desconhecidas, adquirem interesse, o que por sua vez, proporciona o desenvolvimento de actividades locais e ganhos económicos para a população local (emprego), mas quando aliada a outros factores, como a cultura, a gastronomia, ou determinados tipos de desporto, entre outros, permite diferenciar regiões, pelas suas características particulares, conferindo-lhes uma identidade única. O crescente interesse por estas temáticas está a criar uma maturação do Geoturismo, tanto para as instituições como para os cidadãos (CASTALDINI, 2009). Este autor refere, também, que estas actividades são uma oportunidade de emprego para os especialistas em geologia, geomorfologia e outras áreas das Ciências da Terra.
A geoconservação ao nível europeu, já para não falar a nível mundial, tem sido alvo de várias promoções e HOSE (2005), considera que iniciativas deste género são um complemento fundamental para o desenvolvimento do Geoturismo, requerendo estratégias que funcionem em unidade. A efectivação dos valores naturais patrimoniais só se efectivará quando for integrado de forma consciente e planificada nas estratégias do ordenamento do território (RODRIGUES, 2008). É também necessário adoptarem-se usos/práticas compatíveis com o Geopatrimónio, não pondo em causa a sua destruição.
Em suma, o Geopatrimónio, depois de classificado, avaliado e integrado no conjunto patrimonial de uma região, constitui sem dúvida uma mais valia para o seu desenvolvimento sustentável, ao proporcionar o desenvolvimento do Geoturismo, com a integração de outros recursos regionais ou locais, para além da integração com o património cultural (material e imaterial). Neste contexto, sublinha-se a importância do conhecimento científico, na determinação dos elementos naturais que devem integrar o Geopatrimónio.
Referências Bibliográficas
BRILHA, J. (2005) Geodiversidade. In Património Geológico e Geoconservação – A Conservação da Natureza na sua Vertente Geológica, Palimage, p.17-126.
CARCAVILLA, L. (2009) - Geological Heritage and Geoconservation in Spain: Past, Present, and Future. In Geoheritage, N. º 1, p. 75-91.
CASTALDINI, D. et al (2009) - Geodiversity and Geotourism as a Challenge Between Scientific Culture of Geological Landscape and New Opportunity Ofworks. In The role of geomorphology in land management, III National AIGeo Conference, Modena & Alta Val Badia, p. 58.
CASTRO, C. et al (2010) - Peligros naturales en geositios de interés patrimonial en la costa sur de Atacama. In Revista de Geografía Norte Grande, N. º 45, p. 21-39.
CENDRERO, A. (1996) - El patrimonio geológico: bases para su valoración, protección, conservación y utilización. In Transporte y Medio Ambiente (MOPT) Madrid: Ministerio de Obras Públicas, Serie Monografías.
CORATZA, P. (2005) – Methodological Proposal for the Assessment of the scientific quality of geomorphosites. In II Quaternario, Italian Journal of Quaternary Sciences, Nº 18 (1), p. 307-313.
COUTO, H.; LOURENÇO, A. (2005) – Geoconservação e Desenvolvimento Sustentável. In Cultura Light, Faculdade de Letras da Universidade do Porto, Porto, p. 10-14.
GIANOLLA, P.; PANIZZA, M. (2009) –Le Dolomiti dichiarate dall’UNESCO patrimonio mondiale dell’Umanità. In Geoitalia, Nº28, p.56-63.
GRAY, M. et al (2002) - Geodiversity and Geoheritage as features of Soil Protection. In European Union Soil Thematic Strategy, Committee on the Environment, p. 1-11.
HOSE, T. (2005) - Landscapes of Meaning: Geotourism and the Sustainable Exploitation of the European Geoheritage. Institute of Geography, University of Lausanne.
PANIZZA, M. (2009) – Geomorphodiversity of the Dolomites and some remarks on recenté rock falls. A Key of Geoheritage Assessment. Geoheritage, p. 343-345.6
PIACENTE, S. (2005) – Geosites and Geodiversity for a Cultural Approach to Geology. In II Quaternario, Italian Journal of Quaternary Sciences, Nº 18 (1), p. 11-14.
RODRIGUES, M.; FONSECA, A. (2008) – A Valorização do Geopatrimónio no Desenvolvimento Sustentável de Áreas Rurais. Colóquio Ibérico de Estudos Rurais, Coimbra.
STANLEY, M. (2001) – Geodiversity Strategy. In ProGEO News, Nº1.
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